Relembre os sucessos de Elis Regina que continuam sendo regravados

Elis Regina nasceu em Porto Alegre, no dia 17 de março de 1945. Considerada até hoje, por muitos especialistas, a maior cantora brasileira de todos os tempos, ela morreu precocemente aos 36 anos de idade, no dia 19 de janeiro de 1982, mas deixou sucessos inesquecíveis na memória dos brasileiros. O temperamento forte também rendeu a ela os apelidos de Furacão e Pimentinha. A gana na hora de interpretar surge em canções como “Madalena”, a parceria de Ivan Lins e Ronaldo Monteiro, lançada por Elis Regina em 1970.

“Fascinação” (valsa, 1905) – Fermo Dante Marchetti e Maurice de Féraudy
Escrita em 1905 por Fermo Dante Marchetti e Maurice de Féraudy, a valsa francesa “Fascinação” rodou o mundo e se tornou uma das mais populares de todos os tempos. Em 1943, recebeu uma versão em português criada por Armando Louzada e gravada no mesmo ano por Carlos Galhardo em companhia de sua orquestra. O cantor ficaria conhecido como o “Rei da Valsa”. Três décadas depois, em 1976, Elis Regina a resgatou para o espetáculo “Falso Brilhante”, em uma interpretação arrebatadora. A música entrou para a trilha da novela “O Casarão” e recebeu versões de Nana Caymmi e Ney Matogrosso.

“Amor Até o Fim” (samba, 1966) – Gilberto Gil
Na década de 1960, Elis Regina foi convidada para apresentar, com Jair Rodrigues, o programa “O Fino da Bossa”, na TV Record de São Paulo. O sucesso da atração rendeu três discos que repetiram o êxito da empreitada, intitulados “Dois na Bossa”. Ao estrear a série, Elis e Jair tornaram-se detentores do primeiro disco da música brasileira a ultrapassar a barreira de um milhão de cópias vendidas. 

Num desses álbuns, a dupla interpretou “Amor Até o Fim”, samba entusiasmado de Gilberto Gil, um novato compositor baiano que, em breve, se destacaria com a Tropicália. Elis regravou a música em 1974 e também a cantou em um dueto descontraído com Gal Costa, conterrânea de Gil.

“Madalena” (MPB, 1970) – Ivan Lins e Ronaldo Monteiro
Ivan Lins fazia parte do MAU (Movimento Artístico Universitário), que, durante a resistência cultural à ditatura reunia futuros astros da música popular brasileira, casos de Gonzaguinha, Aldir Blanc e César Costa Filho. Esse grupo se reunia na casa do psiquiatra Aloísio Porto Carreiro e de sua esposa Maria Ruth. 

Foi lá que surgiu “Madalena”, um samba com toda a pinta de MPB, composto por Ivan Lins e Ronaldo Monteiro. Atenta às novidades, Elis Regina logo pescou a pérola e gravou a música em 1970, que recebeu um arranjo especial de Chiquinho de Morais, com destaque para o toque de seu piano. “Oh Madalena, o meu peito percebeu/ Que o mar é uma gota/ Comparado ao pranto meu…”, interpreta Elis.

“Casa no Campo” (rock rural, 1972) – Zé Rodrix e Tavito
Durante uma viagem de ônibus pelo interior de Goiás, Zé Rodrix escreveu, em uma folha perdida de papel, o poema que daria origem à canção “Casa no Campo”. Os versos foram entregues para Tavito, acompanhados de uma melodia sugerida. 

Quando escreveu a letra, Zé Rodrix contemplava a paisagem através da janela do ônibus, enquanto pensava que sua esposa Lizzie estava grávida e, em breve, ele seria pai. No hotel, Tavito venceu o tédio dedilhando ao violão a melodia da música que se consagraria em 72, lançada por Elis Regina. “Eu quero uma casa no campo…/ Onde eu possa compor muitos rocks rurais…”.

“Águas de Março” (bossa nova, 1972) – Tom Jobim
Por sua sofisticação melódica, pela inteligência dos versos e agilidade da interpretação, “Águas de Março” é um ícone da canção brasileira de todos os tempos, mas, sobretudo, pelo sentimento inebriante que transmite, pela sensação de algo novo e renovador. 

A função das chuvas que trazem “promessa de vida no teu coração” não poderia ser representada de maneira mais feliz por Tom Jobim, autor da letra e da melodia, e Elis Regina, que, ao cantar em dueto com o maestro, contribui para dar novos contornos à canção. 

Escrita inicialmente num pedaço de papel de pão, pela ausência de outros recursos, “Águas de Março” anuncia, numa análise mais minuciosa, o triunfo da vida sobre a morte, a importância fertilizante das águas, da chuva, para o recomeço. “São as águas de março fechando o verão…”.

“Atrás da Porta” (MPB, 1972) – Chico Buarque e Francis Hime
Entre os inúmeros talentos de Chico Buarque, um que lhe costuma garantir elogios entusiasmados é a capacidade de calcar letras segundo o ponto de vista feminino. É o caso da dolorida canção “Atrás da Porta”, parceria com o não menos talentoso Francis Hime, gravada em 1972 por Elis Regina com a devida emoção.

É difícil encontrar na história da música brasileira um registro mais dilacerador do que aquele de Elis dando voz a “Atrás da Porta” no palco, sem conseguir conter as lágrimas que se derramam de seus olhos. Melodia, letra, interpretação, tudo contribui para elevar “Atrás da Porta” a um clássico da MPB.

“Dois Pra Lá, Dois Pra Cá” (bolero, 1974) – João Bosco e Aldir Blanc
Nas décadas de 1940 e 1950, o principal gênero estrangeiro a dominar as rádios brasileiras era o bolero, vindo diretamente do México e com influência direta sobre o samba-canção. O projeto de dominação cultural norte-americana em breve se apropriaria do samba e de Carmen Miranda para reverter essa história. 

Prestando tributo ao bolero, João Bosco e Aldir Blanc compuseram “Dois Pra Lá, Dois Pra Cá”, que, ao mesmo tempo, tirava sarro dos habituais derramamentos do gênero. Com habilidade única, Blanc consegue levar, para a letra, a elegância de um universo pautado pelas paixões lancinantes. 

Nunca, na música brasileira, alguém soube utilizar tão bem a palavra band-aid, no improvável verso “e a ponta de um torturante band-aid no calcanhar”. Ao lançar a música, em 1974, Elis Regina também deu a sua parcela de contribuição. 

A intérprete acrescentou, ao final da letra, versos em espanhol do bolero “La Puerta”, sucesso do cantor chileno Lucho Gatica, que teve regravações de Altemar Dutra e Nana Caymmi.

“Como Nossos Pais” (MPB, 1976) – Belchior
Elis Regina, embora identificada noutro momento com a tradição da canção brasileira, gostava de pinçar novos compositores e descobrir músicas novas. Numa dessas procuras, ela descobriu Belchior, vindo de Sobral, no interior do Ceará, deparando-se com as dificuldades e asperezas da cidade grande. 

O relato verborrágico e narrativo do compositor, que se cristalizaria como marca registrada ao longo dos anos, pegou de jeito não só a intérprete, como multidões de todas as idades, que repetiam, inflamados, os versos de inconformidade e desalento presentes na moderna elegia de Belchior. “Como Nossos Pais” ganhou prestígio imediato em todo o território nacional, por seu poder de identificação, centrado na simplicidade do tema, salpicado de frases precisas.

“Romaria” (toada, 1977) – Renato Teixeira
Elis Regina estava grávida de sete meses quando pisou no palco do “O Fino da Música”, série de shows idealizada por Zuza Homem de Mello, para cantar “Romaria”, composição até então desconhecida que se tornaria um de seus maiores sucessos. 

Elis conheceu Renato Teixeira, autor da música, durante a passagem por um estúdio de São Paulo ao lado do marido, César Camargo Mariano. A toada teria os versos elogiados pelo poeta concretista Augusto de Campos, e colocaria Renato Teixeira e a chamada música caipira e sertaneja imediatamente no radar da MPB, graças ao faro para novidades de Elis Regina.

“O Bêbado e a Equilibrista” (MPB, 1979) – João Bosco e Aldir Blanc
O ano de 1979 ficou marcado pelo lançamento de “O Bêbado e a Equilibrista”, uma canção inesquecível por três motivos. A interpretação de Elis Regina, sempre visceral, a melodia de João Bosco e a letra de Aldir Blanc que retratavam um momento de dificuldade e superação pelo qual passava o país, em plena ditadura militar, mas, sobretudo, os personagens retratados nesta parábola do real. 

Dentre eles, o sociólogo Betinho, simbolizado pela “volta do irmão do Henfil”, após o exílio, era um dos nomes mais reverenciados naquela anistia política. A ele se juntavam personagens famosos como Carlitos, interpretado por Charlie Chaplin nos cinemas, e outros facilmente identificáveis, anônimos, mas, apesar disto, conhecidos, como os bêbados e equilibristas do Brasil.