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Eleições 2024: Violência política de gênero é um desafio na internet

Pixabay

O líder de um grupo de ódio, organizado em fóruns virtuais (conhecidos como chans) para atacar parlamentares brasileiras no ano passado, foi localizado quase um ano após o envio das mensagens, no início do período eleitoral das eleições deste ano.

O caso é um dos muitos episódios de violência política no Brasil e a proliferação destes grupos na internet faz com que o debate em torno da violência política de gênero seja um dos mais importantes às vésperas das eleições municipais de 2024.

Nos ataques virtuais disparados em agosto do ano passado, as vereadoras de Belo Horizonte Iza Lourença (PSOL) e Cida Falabella (PSOL) foram as primeiras a receber emails com ameaças de ‘estupro corretivo’. Elas levaram a denúncia à polícia. Após a divulgação do caso, deputadas que se solidarizaram com as duas vereadoras também passaram a receber ameaças semelhantes.

Outro crime cometido pelo grupo foi o vazamento de dados pessoais como e-mails, números de telefone e endereços das parlamentares e de seus familiares.

Falta de uma rede de denúncia é a principal queixa das parlamentares

A vereadora de Belo Horizonte, Iza Lourença (PSOL) lamentou a dificuldade encontrada para a denúncia desses casos. Segundo ela, foi um longo caminho para que o líder do grupo fosse preso e a falta de uma rede específica para os crimes de violência política dificulta o processo.

“Nós fomos na delegacia de crimes cibernéticos, mandaram a gente para delegacia de direitos humanos, lá nos mandaram para o Ministério Público. Se você pode procurar 17 canais diferentes para fazer uma denúncia, quer dizer que não existe um canal específico para tratar da violência política”, denunciou a vereadora.

“Claro que existe hoje, no MP Estadual, o Observatório da Democracia, mas a gente ainda precisa dar muito mais passos para que as mulheres se sintam seguras e não desistam de estar presentes na política”, afirmou Iza.

Violência no Ambiente Digital

Segundo o último relatório disponibilizado pelo Observatório Brasileiro de Violência Online, da Universidade de Brasília, 75% das vítimas de violência online são meninas e mulheres e os principais casos são de crimes contra honra/cyberbullying e vazamento de imagens, além do discurso de ódio.

No ano passado, pesquisadores da Universidade Federal Fluminense produziram um estudo que detalha a violência política contra mulheres nas plataformas digitais. No período de seis meses foram encontradas mais de 4 milhões de mensagens e cerca de 9% delas, ou seja, 360 mil, traziam alguma ofensa.

A socióloga, cientista política e pesquisadora de gênero, Bruna Camilo, ressaltou como o ambiente digital se tornou parte do nosso cotidiano, sobretudo após a pandemia.

“Eu sempre falo que é muito importante pensar na regulação da internet. Não existe ainda uma regulação que de fato puna determinadas plataformas e perfis que façam um ataque. Porque são pessoas anônimas que acreditam que nada vai acontecer com elas”, comentou a pesquisadora sobre a sensação de impunidade dos crimes virtuais.

Para Bruna, esse é um debate que mal começou e está longe de se esgotar. “Eu espero que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) se preocupe com o ambiente virtual, porque a gente sabe que é importante as campanhas de rua, mas as eleições hoje são fundamentalmente ocorridas no âmbito digital”.

Eleições 2024

A preocupação em torno da violência de gênero no âmbito digital já é um debate presente para as eleições de 2024. Segundo a juíza Patrícia Henrique Ribeiro, integrante da Corte Eleitoral, destacou que já há um entendimento de competência por parte da Justiça Eleitoral de Minas Gerais sobre a violência política.

“Hoje a principal preocupação da justiça eleitoral é a desinformação. Qualquer candidato que se sentir lesado e sofrer violência no âmbito digital pode representar uma ação”, destacou.

Somado a isso, Minas Gerais foi o 1º estado brasileiro a aprovar uma lei de combate a violência política contra mulheres. A lei, aprovada em 2023, é de autoria das deputadas Ana Paula Siqueira (Rede), Leninha (PT), Andréia de Jesus (PT) e Beatriz Cerqueira (PT), que foram vítimas de ameaças virtuais.

Projeto de Lei

As vereadoras Iza Lourença e Cida Falabella, primeiras vítimas das ameaças do caso que se iniciou em agosto de 2023, protocolaram um projeto para Câmara Municipal de Belo Horizonte que visa instituir uma política municipal de enfrentamento a Violência Política contra a mulher na cidade.

O projeto abrange não somente mulheres eleitas, mas também candidatas ou nomeadas a cargos públicos – também vítimas de violência e que não recebem o mesmo amparo.

Em sua justificativa, é alegado que a falta de uma legislação específica que aborde e combata essa problemática contribui para a perpetuação da desigualdade de gênero no ambiente político, impedindo o pleno desenvolvimento e participação das mulheres na esfera pública.

Garantir um ambiente seguro para as mulheres na política é garantir o exercício da Democracia

Bruna Camillo reforçou que a violência política interfere no exercício da Democracia. “A gente não está falando nem de lei, mas estamos falando ao redor dessa candidata, dessa vereadora. Essa mulher precisa estar segura de conseguir exercer seu papel”.

Ela destacou ainda a necessidade de garantir um ambiente que torne possível o exercício do trabalho, sem que essas mulheres estejam coagidas e vulneráveis. “Isso é fundamental para a gente conseguir fortalecer, para fazer com que mais mulheres estejam encorajadas para estarem na política”, continuou, ao reforçar a ideia da criação de uma rede de apoio.

“Uma rede de apoio para que as mulheres sejam ouvidas, para que elas não sejam invisibilizadas, silenciadas e mortas. Porque infelizmente a ponta do iceberg acontece no feminicídio político”.

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